Engraçado como são as coisas no vai-e-vem que chamamos vida...
Em alguns momentos me pego sonhando com o pote de ouro lá do outro lado do arco-íris (por exemplo, quando me dá aquele desejo de comer justamente AQUELA sobremesa para a qual eu não tenho na dispensa nenhum dos ingredientes necessários. Ou quando me pego sonhando em ganhar na Mega-Sena acumulada e eu sequer fiz a aposta para AQUELE concurso). Em resumo, para que simplificar se dá para complicar, não é mesmo? Já em outras ocasiões, encontro prazer nas pequenas trivialidades da vida cotidiana. Ontem mesmo foi um desses deliciosos momentos de simples felicidade.
Mesmo não fazendo parte do meu cardápio diário, EU AMO FEIJÃO. De todos os tipos e cores. Preparado do modo "tradicional" ou servido em saladas frias. Raramente cozinho feijão à moda "tradicional" aqui em casa, pois com o calor que faz no Rio de Janeiro não é sempre que estou afim de um prato fumegante à minha frente. E eu prefiro o feijão fresquinho, cheiroso, com o caldo bem encorpado... Ou seja, aquele que vai bem com tudo, mesmo que seja só com farinha e molho de pimenta Tabasco. Confesso minhas desconhecidas raízes nordestinas: eu adoro comer feijão com farinha e molho de pimenta... Sem mais acompanhamentos. Ele assim é meu prato principal.
Como acabo tendo que congelar a maior parte do que é preparado, o prato acaba perdendo muito do seu encanto original (que para mim é aquele cheiro temperado, que invade a casa e deixa no ar uma lembrança boa de colo de mãe...). Tudo bem que hoje em dia existem soluções industrializadas para "rejuvenescer" o feijão e deixá-lo com cara de quem acabou de sair da panela de pressão. Eu cheguei a me render a essa facilidade da vida moderna. Mas depois que eu me dei conta que cada sachê minúsculo daqueles contém QUASE 40% DA PORÇÃO DIÁRIA DE SÓDIO, para o bem da minha saúde, eu aboli este item da lista de compras sem prensar duas vezes. Nem sei como eu não havia me atentado para essa informação antes, já que tenho mania de ler rótulos (bulas, encartes, manuais, etc...) de tudo. Mas esse dados me passou despercebido. Apesar disso, no fim das contas, minha pressão arterial agradece.
Voltemos ao feijão. Mas antes, parênteses científicos: o intestino humano produz em média 3 litros de gases por dia e esse volume pode ser aumentado absurdamente por conta dos hábitos alimentares. A presença de polissacarídeos que não são digeridos na boca, estômago e intestino delgado - como é o caso dos fitatos nas sementes de leguminosas, faz com que esses açúcares sejam fermentados no intestino grosso pela flora bacteriana lá presente. Está aí o motivo pelo qual eu sempre deixo o feijão de molho de um dia para o outro: para evitar o borborigmo e os demais efeitos colaterais constrangedores causados pelos gases gerados pela ingestão de feijão.
Infelizmente não tinha em casa o gengibre fresco, que além de ser um tempero dos meus preferidos, também é ótimo para evitar esses efeitos adversos das leguminosas [esse segredinho eu aprendi com a Sangita, que cozinha maravilhosamente e é quem prepara a prasada lá do +RadheShyamRefeitorio Vegan-lactovegetariano]. Outro excelente aliado é a folha de louro, que não pode faltar num bom feijão. Esse ingrediente, que sempre tenho em casa, deve ser guardado em pote bem fechado, para conservar o aroma e suas propriedades.
Depois de deixar de molho de véspera, temperar generosamente com alho, cebola, pimenta do reino, louro em folha, e um pouco de páprica picante, deixei na pressão por uns 40 minutos. Enquanto isso, me deliciava com o aroma de tempero exalado pela panela. Para acompanhar o feijão, fiz um arroz. simples [mas não menos importante]. Afinal de contas, aquele feijão cheiroso merecia um acompanhamento à altura. E não há nada que combine melhor do que feijão com arroz. Nunca entendi porque alguns associam um ar pejorativo à expressão (sinônimo de "ralé", "insatisfatório'') Para mim, seja "arroz com feijão" ou "feijão com arroz", essa dupla é sublime! Pensei em fritar uns ovos, mas desisti. Arroz soltinho com feijão macio de caldo cremoso estava perfeito para mim. Não precisava de mais nada para me fartar.
Agora você deve estar se perguntando porque eu estou dando mil voltas num texto sobre culinária, depois de falar sobre minhas raízes nordestinas ocultas, colo de mãe, temperatura na capital fluminense, recomendações nutricionais diárias e fisiologia humana... Então, voltemos a falar das pequenas e deliciosas simplicidades da vida, o que me levou a sentir vontade de escrever esta postagem e compartilhar meu sentimento com vocês...
Comer um prato bem servido de arroz com feijão ontem à noite, com direito a repeteco, me deu uma sensação maravilhosa de satisfação... Bem-estar total. Sensação que nós costumamos sentir quando passamos por uma experiência agradável, damos boas gargalhadas ou simplesmente sentimos o cheio da chuva. Essa sensação causada pelas "pequenas boas coisas da vida": aquelas que não nos custam nada, não dependem de ninguém e estão acessíveis a todos nós, simples mortais. Enfim, esse prato de feijão com arroz me fez (re)lembrar de algo que eu nunca deveria ter esquecido: "tudo que preciso para atingi a PLENITUDE está dentro de mim."
Para mim, cozinhar é uma arte. Cada prato é único. Mesmo que eu repita a receita, as refeições não serão iguais. É também uma terapia, onde coloco 'tudo em pratos limpos' na minha cabeça. E acima de tudo, é uma prática meditativa, na qual mergulho sem pressa... Lavo e pico os ingredientes cuidadosamente. Refogo os temperos e sinto seu aroma se desprendendo. Cozinho tudo em fogo baixo, para apurar os sabores. Este blog é um registro de minhas experiências na cozinha, onde alcanço meu ‘nirvana’.
quinta-feira, 12 de setembro de 2013
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